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Infinita
Author: Jodi Meadows


1

   FINAIS

   MINHA MORTE NÃO seria um recomeço.

   Por milhares de anos, a morte em Range significou outro renascimento. Outra vida. Até que alguém morreu na noite em que o templo escureceu, e eu nasci no lugar dessa pessoa.

   Uma sem-alma. Uma almanova. Uma alma rejeitada.

   Eu era um mistério que todos buscavam controlar, uma criatura assustadora que havia obrigado o mundo a reconsiderar tudo o que sabia sobre a vida e a morte e o que acontecia em seguida. Mas era a única. Um mistério a ser desesperadamente ignorado, um erro que jamais se repetiria.

   Até que meu pai planejou um segundo Escurecimento do Templo e, para dezenas de almas antigas, isso representou a morte definitiva. Violenta. Apavorante. Irreversível.

   No ano que se seguiu, outras almasnovas nasceram, e o mundo lamentou com mais veemência ainda a perda das almasnegras, sem se dar conta da verdade sinistra a respeito da reencarnação. Todos achavam que renascer era algo natural, quando a verdade era exatamente o oposto: enquanto as almas antigas viviam, morriam e renasciam, milhões de almasnovas eram consumidas pela entidade responsável por essas reencarnações.

   Janan. O Devorador. Um ser que um dia fora humano, mas que tinha ido longe demais e agora estava prestes a provocar a destruição do mundo.

   Quando isso acontecesse, não restaria nada além de finais.

 


   O relógio bateu meia-noite.

   O Ano das Almas começou com um estrondo trovejante nas entranhas da terra.

   — O que foi isso? — Minha voz retumbou pela sala, cujo chão continuava coberto por restos de instrumentos arruinados e pétalas de rosas. A luz da cozinha incidia sobre um quadrado de tábuas empoeiradas do piso, mas, afora isso, a sala estava imersa em penumbra. Tínhamos acordado alguns minutos antes, após pegarmos no sono no sofá depois que nossos amigos foram embora na noite anterior.

   Do outro lado da sala, Sam inclinou a cabeça e apurou os ouvidos. Uma franja de cabelos negros encobriu-lhe os olhos, enquanto ele vasculhava a memória em busca de uma explicação para o estranho trovejar.

   O chão tremeu sob nossos pés. Soltei um grito e me apoiei contra a parede. Os batimentos cardíacos de Janan pulsaram em contato com meus dedos.

   Ajoelhei e apoiei as mãos no chão, distribuindo o peso para me equilibrar melhor.

   — O que está acontecendo? — O pânico fez minha voz soar alta e esganiçada.

   Sam aproximou-se cambaleando devido aos tremores do chão.

   — É um terremoto. Não se preocupe. Vai passar.

   Os objetos de decoração na estante em forma de colmeia que dividia a sala da cozinha tilintaram ao baterem uns contra os outros. Algumas estatuetas de obsidiana caíram das prateleiras. Um som de madeira, pedra e vidro batendo, rolando e se espatifando no chão ecoou pela sala. Redemoinhos de pétalas se formaram em alguns lugares.

   O tremor enfraqueceu, mas não parou. O mundo regurgitou mais uma vez e fez com que tudo tombasse de lado. Peças de mobília viraram no andar de cima. Galhos de árvores se partiram do lado de fora. A terra inteira rugiu. Gritei quando as prateleiras esculpidas à mão racharam, lançando farpas por toda a sala.

   Sam tropeçou e caiu ligeiramente fora do meu alcance. Uma expressão de surpresa e dor cruzou-lhe o rosto e ele levou a mão fechada ao peito, apertando-a com força. Uma mancha escura de sangue se espalhou pela camisa cinza do pijama.

   — Sam! — Comecei a engatinhar em direção a ele, lutando contra o chão instável. — O que aconteceu com a sua mão? — Assim que terminei de formular a pergunta, vi um caco de vidro ensanguentado ao lado dele.

   — Não foi nada. Está tudo bem. — O mundo pareceu se acalmar e ele se sentou nos calcanhares, apertando a mão machucada com a outra. — Até que não foi tão ruim assim.

   A ideia dele de ruim devia ser o planeta inteiro se desfazendo. O silêncio repentino da terra estendeu-se pela casa, vivo e pesado. Agourento.

   Sem conseguir confiar que o chão se manteria firme, arrastei-me sentada até ele, mantendo uma boa distância dos cacos de vidro.

   Duas semanas antes, o conselheiro Deborl e seus amigos tinham destruído todos os instrumentos da sala do Sam. O piano, o cravo, o violoncelo, até mesmo outros instrumentos menores que deixávamos guardados dentro dos estojos. Só os que estavam no segundo andar tinham sido poupados, entre eles minha flauta. Por precisar de um pequeno reparo, ela estava na oficina. Fora salva por um simples golpe de sorte do destino.

   Eu havia limpado a maior parte dos escombros imediatamente. O que restava eram pedaços que talvez um dia pudessem ser reutilizados, assim como as pétalas secas das rosas que tinham decorado uma festa com nossos amigos.

   Agora, porém, a sala estava num estado mais deplorável do que Deborl conseguira deixar.

   As prateleiras pendiam em ângulos estranhos, deixando livros, caixas e pedaços de objetos decorativos espalhados por todos os lados. Elas pareciam dentes prontos a se fecharem sobre alguma coisa.

   Uma das lâmpadas se soltara do bocal e se espatifara no chão, deixando um rastro brilhante de cacos de vidro. Foi uma sorte ela não ter iniciado um incêndio. Qual seria o estado da cozinha, do segundo andar e das construções externas? Tinham ocorrido tantos tremores, tão fortes e em tão pouco tempo, que qualquer coisa poderia ter acontecido.

   — Como está a sua mão? — Agachei-me ao lado dele e a puxei para ver.

   — Está bem. — Mentira. A mão dele tremeu entre as minhas, a pele escorregadia devido ao sangue. Era difícil ver qualquer coisa sob todo aquele vermelho, mas pelo visto os cacos haviam rasgado a palma e os dedos.

   — Precisamos limpar isso. Aguente firme.

   Sam anuiu e se manteve imóvel enquanto eu retirava caco por caco. As pontas dos meus próprios dedos começaram a doer, mas continuei até não conseguir encontrar mais nenhum. Seria bom limpar o ferimento, mas antes precisava fazê-lo parar de sangrar.

   — Isso vai doer.

   — Já está doendo. — A voz dele soou áspera.

   Quis dizer alguma coisa para tranquilizá-lo, mas não fazia ideia da extensão do machucado para prometer o que quer que fosse. Se após limpar o sangue o aspecto estivesse muito feio, ligaria para Rin, a médica. Por ora, peguei um pedaço grande de vidro, rasguei uma tira da minha camisola para improvisar uma atadura e a enrolei na mão dele, dando tantas voltas quanto possível.

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