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Sadie(5)
Author: Courtney Summers

WEST McCRAY:

Tenho, sim. Uma filha.

MAY BETH FOSTER:

Então você entende.

 

 

sadie

Três dias depois, eu pinto o cabelo.

Faço isso em um banheiro público no caminho. A amônia se mistura com o fedor nas cabines sujas e me dá vontade de vomitar. Eu nunca tinha pintado o cabelo, e o resultado é um louro sujo. Na garota da embalagem ficou dourado, mas não importa, porque o objetivo era só ficar diferente.

Mattie teria odiado. Teria dito na minha cara. Você nunca me deixa pintar o cabelo, ela ia choramingar com aquela voz fina. E quando digo fina, não quero dizer frágil nem fraca. A voz só nunca encorpou. Quando ela ria, ficava tão aguda que machucava meus ouvidos. Mas não estou reclamando porque, quando a Mattie ria, era como estar em um avião à noite, olhando para uma cidade que você nunca visitou e que está toda iluminada. Ou pelo menos imagino que seria assim. Nunca andei de avião.

E é verdade, mesmo. Eu nunca deixei que ela pintasse o cabelo. Quando ela estava violando todas as regras do meu livro (ligue se for para a casa de uma amiga, não mande mensagem de texto para meninos sem me dizer, guarde o celular e faça a porcaria do dever de uma vez), foi só essa que ela escolheu honrar: nada de pintar o cabelo antes dos quatorze anos. Foi por pouco.

Acho que o verdadeiro motivo para a Mattie nunca ter tocado no cabelo foi porque ela herdou o louro da mamãe e não conseguia nem imaginar perder o pouco dela que ainda tinha. Sempre me deixou louca o quanto as duas eram parecidas, com o cabelo, os olhos azuis e o formato do rosto iguais. Mattie e eu não tínhamos o mesmo pai e não parecíamos irmãs, a não ser que alguém nos visse fazendo as mesmas expressões nos raros momentos em que tínhamos a mesma opinião sobre alguma coisa. Entre eu, ela e nossa mãe, eu que era a diferente, com cachos castanhos e desgrenhados e olhos cinzentos em um rosto que May Beth sempre chamou de rosto de pardal. Mattie era tão magra que parecia não ter se desenvolvido e chegava a ser desengonçada, mas isso vinha com um tipo especial de suavidade, uma coisa menos visualmente cínica em comparação a mim. Sou o resultado de mamadeiras cheias de refrigerante Mountain Dew. Tenho um organismo que não sabe muito bem absorver as melhores coisas da vida. Meu corpo é anguloso o suficiente para cortar vidro e sofre de uma necessidade desesperada de se arredondar, mas às vezes não me importo. Um corpo pode nem sempre ser belo, mas um corpo pode ser uma bela enganação. Sou mais forte do que pareço.

Está escuro quando aparece a placa da parada de caminhões Whittler.

Uma parada de estrada. Era a coisa mais próxima de um botão de pausa para as pessoas que vivem aceleradas. Só que elas não param exatamente, apenas reduzem até chegar numa velocidade que, ainda assim, é mais ou menos o dobro daquela das pessoas normais. Eu trabalhava em um posto de gasolina nos arredores de Cold Creek, e meu chefe, Marty, nunca me deixava trabalhar à noite sozinha de tão pouco que ele confiava nos caminhoneiros que passavam. Não sei se era justo da parte dele, mas era o que ele achava. Whittler é maior do que o lugar de onde venho, e não parece tão limpa. Ou talvez as pessoas estejam tão acostumadas com a sujeira de casa que com o tempo se convencem de que tudo está exatamente onde deveria. Nada aqui está se esforçando para ser bom. As luzes néon do letreiro do posto de gasolina parecem mais apagadas do que deveriam estar, como se estivessem escolhendo se apagar lentamente em vez de sumir com aquele pop repentino.

Vou para a lanchonete, onde tem Ray’s escrito em letra cursiva em uma placa pequena demais para o prédio embaixo dela, fazendo tudo parecer vertiginosamente torto. melhor torta de maçã do condado de garnet!, diz um cartaz malfeito preso na janela. experimente uma fatia!

Empurro a pesada porta de vidro e entro nos anos 1950. O Ray’s é exatamente como descreveram, vinil vermelho e turquesa, as garçonetes de vestidos e aventais combinando. Bobby Vinton está tocando em uma jukebox antiquada no canto, e fico ali parada, absorvendo a nostalgia, o cheiro de batata ao molho do ambiente, antes de seguir até o balcão nos fundos. O balcão de condimentos e a cozinha ficam logo depois.

Sento-me em um dos bancos e apoio as mãos na bancada fria de fórmica. À minha direita, há uma garota. Garota. Mulher. Ela está curvada sobre um prato de comida parcialmente consumida, os polegares se movendo rapidamente na tela do celular. Seu cabelo é castanho ondulado e ela tem tanta pele pálida exposta que tremo só de olhar. Está de scarpins pretos, um short bem curto e um top fino e apertado. Acho que trabalha no estacionamento. Lagartas de estacionamento. É assim que chamam garotas como ela. Meu olhar procura uma visão melhor do seu rosto, mais jovem do que parece, com a pele maltratada pelas circunstâncias, não pela passagem do tempo. As linhas nos cantos dos olhos e acima da boca me lembram rachaduras numa armadura.

Apoio os cotovelos na bancada e baixo a cabeça. Agora que parei, começo a sentir o efeito da viagem no meu corpo. Não estou acostumada com tanto tempo ao volante e estou cansada pra caralho. Os músculos das minhas costas estão travados em nós apertados. Tento concentrar cada dor individual em uma dor única que eu possa ignorar.

Depois de um minuto, um homem sai da cozinha. Ele tem pele morena, cabeça raspada e lindos braços fechados com tatuagens coloridas. Crânios e flores. A camiseta preta dizendo Ray’s está esticada no peito, apertada o suficiente para exibir as partes do corpo que ele deve ter se esforçado para obter. Ele seca as mãos no pano de prato oleoso pendurado no cinto e me olha de cima a baixo.

– Vai querer o quê?

A voz dele parece uma faca que se afia nas outras pessoas, intimidante o suficiente para eu nem conseguir imaginar como seria o som de um grito dele. Antes que eu possa perguntar se ele é o Ray, reparo que o crachá na camisa diz saul. Ele vira o ouvido para mim e me pede para repetir, como se eu tivesse soltado palavras e ele só não tivesse ouvido.

Minha gagueira está quase sempre presente. Conheço-a melhor do que qualquer outra parte de mim, mas quando estou cansada pode ser tão impossivelmente imprevisível quanto Mattie quando tinha quatro anos e começou a brincar de esconde-esconde por todo o bairro sem dizer para ninguém que estava brincando. Chega uma hora em que preciso falar, mas não quero desperdiçar um possível espetáculo com alguém que não sei se vai me dar o que preciso, então limpo a garganta e pego o pequeno cardápio plastificado ao lado de uma cesta de guardanapos e procuro algo barato. Olho para Saul, aponto para a garganta e digo desculpa com movimentos labiais, como se eu estivesse com uma porra de laringite. Bato com o dedo no cardápio para ele perceber que isso sou eu me comunicando. Seu olhar segue meu dedo e as batidinhas até chegar em café… dois dólares.

Um minuto depois, ele coloca uma caneca embaixo do meu nariz e diz:

– Só pra ficar bem claro, você não pode passar a noite enrolando só com isso aí na mão. Beba enquanto ainda está quente ou acrescente uma refeição.

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