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Sadie(3)
Author: Courtney Summers

– Você parecia bem mais velha no e-mail – ela diz.

Dou de ombros e estico o braço mais um pouco. Pega o dinheiro, Becki, tenho vontade de dizer, antes que eu pergunte pra quê você precisa dele. Porque o homem no carro parece inquieto, abstinente. Eu conheço aquele olhar. Reconheceria em qualquer lugar, em qualquer um. Veria até no escuro.

Becki esfrega a barriga redonda e chega mais perto.

– Sua mãe sabe que você está aqui? – pergunta ela, e decido dar de ombros, o que parece satisfazê-la até que isso para de funcionar de repente. Ela franze a testa e me olha de cima a baixo. – Não sabe, né? Por que ela deixaria você vir aqui sozinha comprar um carro?

Não é uma pergunta para a qual eu possa balançar a cabeça, assentir ou dar de ombros. Lambo os lábios e me preparo para a briga. Eu tenho uma faca, tenho vontade de dizer para a coisa que gosta de esganar a minha voz.

– Minha m-mãe está m-m-m…

Quanto mais eu repito o m-m-m, mais vermelho o rosto dela fica, e menos ela sabe para onde olhar. Não para mim, diretamente nos meus olhos. Minha garganta está apertada, apertada demais, engasgada, e o único jeito de me libertar é parar de tentar conectar as letras. Por mais que eu me esforce na frente da Becki, elas nunca vão se conectar. Só sou fluente quando estou sozinha.

– …orta.

A gagueira melhora.

Eu respiro.

– Meu Deus – diz Becki, e sei que não é por causa da tristeza natural do que acabei de contar, é por causa do jeito quebrado como saiu da minha boca. Ela recua um pouco porque essa merda é contagiosa, sabe, e, se ela pegar, tem cem por cento de chance de transmitir para o feto. – Quer que eu… você sabe dirigir?

É uma das maneiras mais sutis das quais alguém já se valeu para me perguntar se sou burra, mas isso não torna a pergunta menos irritante, ainda mais vinda de uma mulher que não consegue nem escrever por favor direito. Guardo o envelope no bolso e deixo que o gesto fale por mim. Mattie dizia que era a minha teimosia, não a gagueira, a minha pior característica, mas uma não existiria sem a outra. Mesmo assim. Posso me dar ao luxo de fingir que a ignorância da Becki é mais do que estou disposta a aguentar pelo carro usado. Ela ri um pouco, constrangida.

– O que estou dizendo? Claro que sabe… – E, mais uma vez, de forma menos convincente: – Claro que sabe.

– Sei – eu digo, porque nem todas as palavras que digo se partem em pedacinhos.

A normalidade vocal faz Becki relaxar. Ela para de me fazer perder tempo e me mostra que o carro ainda está funcionando ao dar vida ao motor. Ela me diz que a mola do porta-malas está ruim e brinca que vai me deixar ficar com a vareta que eles usam para abri-lo sem cobrar por isso.

Faço ahans e hã-hãs durante toda a transação até fecharmos o negócio, depois me sento no capô do meu novo carro e os vejo darem ré e virarem à esquerda em direção à rodovia. Giro a chave no dedo enquanto o calor da manhã me envolve lentamente. Os mosquitos me acham uma afronta ao território deles e fazem um banquete na minha pele clara e sardenta. O cheiro seco e poeirento de estrada faz cócegas nas minhas narinas, um sinal claro para a parte de mim que está pronta para ir embora, então desço do carro, enfio a bicicleta no mato e a vejo cair sem graça nenhuma de lado.

May Beth me dá mirtilos às vezes, mas também coleciona placas vencidas e as exibe com orgulho no barracão atrás do trailer duplo onde mora. Tem de todas as cores e estados, até de outros países. May Beth tem tantas placas que acho que não vai sentir falta de duas. Os adesivos de registro são cortesia da velha sra. Warner, que mora a três trailers do meu. Ela está fraca demais para dirigir e não precisa mais deles.

Sujo as placas de lama e limpo as palmas das mãos no short enquanto contorno o carro e entro pelo lado do motorista. Os assentos são macios e fundos, e uma queimadura de cigarro marca o espaço entre as minhas pernas. Enfio a chave na ignição e o motor ruge. Enfio o pé no acelerador e o carro se desloca pelo terreno irregular, pelo mesmo caminho que a Becki tomou, até alcançar a rodovia e seguir na direção oposta.

Eu lambo os lábios; o gosto dos mirtilos já sumiu faz tempo, mas ainda consigo imaginar aquela doçura enrugada e sentir falta dela. May Beth vai ficar bem decepcionada quando bater na minha porta e descobrir que fui embora, mas acho que não vai ficar surpresa. A última coisa que ela me disse, com meu rosto aninhado com firmeza nas suas mãos, foi: Seja lá o que você estiver pensando, é melhor tirar dessa sua cabecinha tola agora mesmo. Só que não estava na minha cabeça, estava em meu coração, e foi ela mesma que me disse que, se era pra seguir alguma coisa, melhor que fosse o coração.

Mesmo que ele esteja todo bagunçado.

 

 

AS GAROTAS

T1E1

WEST McCRAY:

Garotas somem toda hora.

Meu chefe, Danny Gilchrist, já vinha falando sobre a ideia de eu apresentar um podcast meu e, quando contei sobre a ligação da May Beth e sobre Mattie e Sadie, ele pediu pra eu dar uma olhada na história. Parecia coisa do destino, na opinião dele, que eu estivesse perto quando Mattie morreu. Mesmo assim, essas foram as primeiras palavras que saíram da minha boca:

Garotas somem toda hora.

Garotas adolescentes agitadas, garotas adolescentes imprudentes. Garotas adolescentes e seus dramas inevitáveis. Sadie tinha sobrevivido a uma perda terrível, e com pouquíssimo esforço da minha parte, deixei a história de lado. Deixei ela de lado. Eu queria uma história nova, diferente e empolgante, e como o sumiço de uma garota adolescente poderia ser isso?

Todo mundo já ouviu essa história.

Danny me lembrou na mesma hora de por que eu que trabalhava para ele, e não o contrário.

DANNY GILCHRIST [TELEFONE]:

Você deve, a si mesmo, uma investigação mais profunda. Não decida o que você não tem antes de saber mais. Você é melhor do que isso. Vá até lá, veja o que descobre.

WEST McCRAY:

Parti para Cold Creek na mesma semana.

MAY BETH FOSTER:

Sadie ficou destruída com o assassinato da Mattie. Ela nunca mais foi a mesma, e entendo isso, mas o fato de que a polícia nunca encontrou o monstro que fez aquilo, bem… Deve ter sido a gota d’água.

WEST McCRAY:

Foi isso que a Sadie disse?

MAY BETH FOSTER:

Não, mas nem precisava. Dava para perceber.

WEST McCRAY [ESTÚDIO]:

Não houve justiça para Mattie Southern.

É impossível para os residentes de Cold Creek aceitarem que um crime executado de forma tão hedionda e caótica ficasse sem solução. A televisão é a referência; afinal, em programas como CSI, o assassino seria capturado em uma hora, muitas vezes com menos pistas do que o que foi descoberto naquele pomar de macieiras.

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